Covid-19: Empresa pode demitir por justa causa empregado que se recusa a tomar a vacina?

31/05/2021

Por Rafael Mello e Israel Cruz

Iniciada a campanha de vacinação muito se passou a discutir sobre a possibilidade de que o empregador determine ao empregado que tome as vacinas contra ao COVID-19 conforme são disponibilizadas a esse empregado pelo poder público.

Conforme a campanha vacinal avança e os grupos de vacinação são ampliados, torna-se cada vez mais importante exaurir a discussão acerca da possibilidade do empregador, em exercício do poder de direção, exigir de seu empregado que se imunize.

Dentre as várias questões decorrentes desse tema, destaca-se a questão que dá título a este breve artigo: a empresa pode demitir por justa causa empregado que se recusa a tomar vacina?

É certo que o debate é acalorado, não apenas no campo ideológico sobre o qual não iremos avançar, mas no âmbito jurídico, colocando em aparente conflito princípios constitucionais relacionados aos direitos individuais do empregado e direitos coletivos relativo à saúde pública.

Quando se discutiu a possibilidade de que a lei determinasse a vacinação compulsória, o Supremo Tribunal Federal por meio do julgamento das ADIs 6586 e 6587 e do ARE 1.267.897, todos publicados em 17/12/2020, entendeu pela possibilidade da vacinação compulsória, caso determinada pelo poder público.

Entretanto o que pretendemos avaliar aqui é até que ponto uma determinação do empregador para que seu empregado se vacine pode se sobrepor à vontade do trabalhador em prol da saúde de seus colegas de trabalho e, principalmente, se é razoável aplicar a pena máxima trabalhista ao empregado que simplesmente se recusa a se imunizar, a despeito de ter ao seu alcance a vacina.

Ainda que tenhamos a convicção de que os efeitos à saúde pública e aos empregados decorrentes de uma pandemia, em especial a que vivemos neste momento, não possa ser atribuída como de responsabilidade do empregador, é bom que se registre que o empregador não pode fugir à responsabilidade que lhe impõe a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) sobre o ônus de propiciar um ambiente de trabalho seguro aos seus empregados.

Então disso se extrai a primeira importante conclusão, ao menos em nossa visão, que o empregador não possui responsabilidade direta pelos efeitos da pandemia, porém deve envidar todos os esforços e medidas ao seu alcance para garantir um ambiente seguro aos seus empregados. Neste contexto, é inegável que o empregador não apenas pode, como deve, se posicionar em relação aos empregados que se recusam a tomar a vacina, colocando seus colegas de trabalho por motivos pessoais e individualistas.

O Ministério Público do Trabalho (MPT), como medida de apoiar seus membros, enfrentou o tema e elaborou um “Guia Técnico Interno do MPT sobre Vacinação da COVID-19”[1]. Em seu guia o MPT aponta justamente a responsabilidade do empregador na manutenção de um ambiente de trabalho seguro a todos os empregados e sugere o afastamento do trabalho do empregado que se recuse a tomar a vacina, bem como a possibilidade de aplicação de sanções disciplinares podendo chegar à justa causa.

A essa altura já está claro que o empregador pode, e deve, impedir que o empregado que se recusa a se imunizar de adentrar ao ambiente de trabalho, bem como não o remunerar por esses dias em que não trabalhou por esse motivo.

Mas então o que justificaria elevar a reação do empregador em relação àquele empregado que, mesmo comunicado, orientado e advertido, insiste em se recusar a seguir as normas de saúde determinadas pelas autoridades públicas e corretamente exigidas pela empresa?

Entendemos que o fundamento legal para aplicação de penalidades de cunho trabalhista ao empregado que injustificadamente recusa a se vacinar, sem prejuízo de outras normas, advém da conjugação do disposto na norma regulamentadora n. 01, itens 1.4.2, alínea “a” e 1.4.2.1, e dos artigos 157, incisos I e III, 158, incisos I e II, e 482, h, todos da CLT.

Evidentemente que cada caso deve ser avaliado de forma individual e com respeito às suas próprias peculiaridades, bem como que é recomendável que o empregado faltoso receba primeiro orientação e informações adequadas e, caso não surta efeitos, passe a ser penalizado de forma gradativa e proporcional à sua insistência no ato faltoso de injustificadamente recusar a imunização a despeito de tal recusa colocar em risco a segurança do ambiente de trabalho.

Nesse panorama, nota-se que é sim possível aplicar a justa causa a um empregado que de forma reiterada e insistente, mesmo orientado e advertido, insiste em colocar todos em risco de forma absolutamente injustificada.

Tanto esse tema é relevante que mesmo diante de uma campanha lenta e tortuosa de vacinação, os primeiros casos práticos decorrentes deste tipo de comportamento começam a aparecer.

Foi exatamente o objeto de recente decisão proferida pela Juíza Isabela Parelli Haddad Flaitt. O caso em questão é de empregada terceirizada que laborava na equipe de limpeza de um hospital municipal da cidade de São Caetano do Sul. Constatou-se que a trabalhadora se recusou a tomar vacina pela segunda vez e, diante da peculiaridade da atividade e do local de trabalho ser um hospital, teve seu contrato rescindido por justa causa.

Em sua decisão a juíza destacou que o direto da empregada em se abster de ser vacinada deveria ser superado pela necessidade de promover e proteger a saúde de todos os trabalhadores e pacientes do Hospital, o que nos parece uma decisão lógica e correta.

Considerando o alto grau de desinformação da população ou mesmo de atribuição ideológica e política ao tema, infelizmente espera-se que as empresas tenham que se preparar para enfrentar situações como a que foi descrita acima, e como dito acima, o ideal é que para cada situação seja realizada uma análise individualizada tanto do contexto da recusa do empregado, quanto da melhor forma de lidar com a situação do ponto de vista jurídico.

Nosso escritório está à disposição para apresentar aos clientes soluções customizadas para cada situação, sempre buscando garantir o atendimento às disposições legais e, ao mesmo tempo, proteger nossos clientes da insegurança jurídica que parece ainda mais presente em temas como o tratado neste texto.

[1] GUIA TÉCNICO INTERNO DO MPT SOBRE VACINAÇÃO DA COVID – 19- Disponível em https://mpt.mp.br/pgt/noticias/estudotecnico_vacinacaocovid19-2.pdf ; Consultado em 18/05/2021 às 13:12

 

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