O que é insolvência transnacional e como é regulada

Por Vitor Antony Ferrari e Ivan Kubala*

É muito comum que grandes empresas possuam sedes e ativos em vários países, comercializando seus produtos e serviços por todo o globo. Todavia, a internacionalização das empresas tornou-se um problema quando, assoladas por crises financeiras, requeriam pedidos de recuperação judicial ou falência. A grande questão era qual o limite da jurisdição do magistrado responsável pelo caso, se haveria a possibilidade de decisões nacionais surtirem efeitos em território estrangeiro. 

A fim de legislar sobre casos internacionais e suas peculiaridades; garantir maior segurança jurídica no comércio internacional, e no próprio procedimento recuperacional ou falimentar; maximizar o valor dos ativos das sociedades transnacionais; e, sobretudo, permitir a reestruturação empresarial em nível internacional, criou-se um modelo de lei baseado na reciprocidade e cooperação internacional entre os Estados, de modo a garantir que os efeitos de uma recuperação judicial ou falência pudessem alcançar outras jurisdições. 

Com isso, tornou-se plenamente possível que uma empresa multinacional em dificuldade econômica, ou até mesmo seu credor, conseguisse que os efeitos de uma recuperação judicial, por exemplo, se fizessem presentes em todos os Estados em que a recuperanda possui ativos ou filiais, permitindo sua reestruturação de forma geral. 

No Brasil, a Lei Modelo que inaugurou a possibilidade de insolvência transnacional foi recepcionada pela Lei 11.101 de 2005, que trata justamente sobre os processos recuperacionais e falimentares no país. Destarte, há expressa previsão legal de como se dá o procedimento de insolvência transnacional envolvendo a jurisdição brasileira.

Primeiro, para que haja o reconhecimento do processo estrangeiro em solo brasileiro, é imprescindível que a sociedade empresária possua bens ou estabelecimentos no país. Ademais, é necessário que o representante do legitimado estrangeiro requeira, perante o

Juízo brasileiro competente, o reconhecimento do processo, apresentando toda a documentação exigida em lei.

Reconhecido, aplicam-se em território nacional os efeitos do procedimento requerido no exterior: suspensão das execuções em curso, bem como o curso de eventuais prescrições e, sobretudo, a ineficácia da transferência de bens do ativo da sociedade empresária sem expressa autorização do Juízo brasileiro e outros expressamente definidos em lei.  

Todavia, necessário ressaltar que, ainda que o processo seja reconhecido no Brasil, nem toda decisão estrangeira sobre o tema produzirá efeitos, mesmo que a ação principal tenha sido ajuizada no exterior. A legislação nacional é expressa ao destacar que somente produzirão efeitos no país as determinações estrangeiras que não contrariem legislação nacional. 

O inverso também é plenamente possível: uma recuperação judicial, ou falência, ajuizada no Brasil pode gerar efeitos em outros Estados, sendo necessário, entretanto, requerer o reconhecimento do processo brasileiro em solo estrangeiro nos termos da legislação vigente àquele local. Ainda que haja uma Lei Modelo internacional, cada país possui suas singularidades, exigindo o cumprimento de especificidades locais. 

O rito ordinário de um processo falimentar ou recuperacional é complexo, sendo importante que as partes envolvidas no caso estejam devidamente representados. Em casos internacionais, há ainda a necessidade constante de confirmar a compatibilidade de decisões e requerimentos com as legislações dos Estados envolvidos, aumentando o grau de complexidade do trabalho desenvolvido. Assim, profissionais especializados na área e com expertise em insolvência transnacional são essenciais para que haja o correto desenvolver do processo, de modo que a parte não seja prejudicada. 

(Com a colaboração de Luís Felipe Meira M. Simão)

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