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Aprovada Lei de Falências

26 de novembro de 2020

Por Antonio Mazzucco, Vitor Antony Ferrari e Ivan Kubala

1 – Em seção plenária o Senado Federal brasileiro aprovou o Projeto de Lei nº 4.458, que modifica de forma relevante a Legislação falimentar brasileira. Referido projeto de lei no Senado decorre do PL nº 6.229, de 2005, o qual foi aprovado na Câmara dos Deputados em 26 de agosto de 2020, na forma de Substitutivo ao Projeto de Lei nº 10.220, de 2018, apresentado pelo Poder Executivo naquele ano e com o objetivo de inserir, na Lei nº 11.101, de 2005, diversas regras jurídicas decorrentes de quinze anos de experiência jurisprudencial sobre o tema e que foram objeto de estudo por Grupo de Trabalho contando com a participação de técnicos do Ministério da Economia, do Poder Judiciário e do Poder Legislativo, bem como de juristas, juízes, economistas e advogados especializados no tema.

2 – o PL 4.458/2020 é composto de 7 artigos que especificamente traz as seguintes alterações, acréscimos e revogações, além de determinar a aplicação imediata (após a vacatio legis) da legislação aos processos em tramite:

  • – o art. 1º altera quarenta e seis artigos da Lei nº 11.101, de 2005, a saber: arts. 6º, 10, 14, 16, 22, 24, 35, 36, 39, 48, 49, 50, 51, 52, 54, 56, 58, 59, 60, 61, 63, 66, 67, 69, 73, 75, 83, 84, 86, 99, 104, 131, 141, 142, 143, 145, 156, 158, 159, 161, 163, 164, 168, 189, 191 e 196;
  • – o art. 2º acrescenta sessenta artigos à Lei nº 11.101, de 2005, a saber: arts. 6º-A, 6º-B, 6º-C, 7º-A, 20-A, 20-B, 20-C, 20-D, 45-A, 48-A, 50-A, 51-A, 56-A, 58-A, 60-A, 66-A, 69-A, 69-B, 69-C, 69-D, 69-E, 69-F, 69-G, 69- H, 69-I, 69-J, 69-K, 69-L, 70-A, 82-A, 114-A, 144-A, 159-A, 167-A, 167-B, 167-C, 167-D, 167-E, 167-F, 167-G, 167-H, 167-I, 167-J, 167-K, 167-L, 167- M, 167-N, 167-O, 167-P, 167-Q, 167-R, 167-S, 167-T, 167-U, 167-V, 167-W, 167-X, 167-Y, 189-A e 193-A;
  • – o art. 3º altera três artigos da Lei nº 10.522, de 2002, a saber: arts. 10-A, 10-B e 10-C;
  • – o art. 4º altera o artigo 11 da Lei nº 8.929, de 1994;
  • – o art. 5º determina aplicação imediata da Lei aos processos pendentes;
  • – o art. 6º revoga dois artigos da Lei nº 11.101, de 2005: o parágrafo único do artigo 86 e o artigo 157; e
  • – o art. 7º encerra vacatio legis de 30 (trinta) dias após a publicação oficial.

Por alterar e por acrescentar um número elevado de dispositivos da Lei nº 11.101 de 2005, e da Lei nº 10.522 de 2002, as mudanças e inclusões propostas pelo Projeto serão abrangidas de forma temática, segundo o entendimento expressado pelo Relator do Projeto o Senador Rodrigo Pacheco.

3 – Alterações relevantes:

I. Autorização expressa do produtor rural a pedir recuperação, judicial ou extrajudicial, visando conceder o auxílio necessário na recuperação econômica de seus negócios, devendo somente ter regularidade em suas informações contábeis

II. Fica mantido o stay period com a regra da Lei atual que o inicia com o deferimento do processamento da recuperação judicial, mas autoriza o juiz a antecipar os efeitos com base no Código de Processo Civil (CPC). Assim, o Juízo poderá antecipar os efeitos para imediatamente após a apresentação da petição e independente do deferimento do processamento, sob pena de responsabilização dos administradores caso não cumpridos os requisitos legais para propositura da RJ. Também permite que o prazo de 180 (cento e oitenta) dias previsto na lei nº 11.101, de 2005, seja prorrogado por 2 (duas) vezes, a primeira a critério do juiz e a segunda a critério dos credores e somente quando houver apresentação de plano alternativo por eles.

III. Permite ao juiz da recuperação interfira em favor da Recuperanda para manter o ativo, mesmo após ultrapassado o stay exclusivamente sobre bens essenciais e bens de capitais], por cooperação jurisdicional, na constrição de bens em sede de execução fiscal ou de reintegração de posse em leasing ou, ainda, em ação de busca e apreensão em propriedade fiduciária, sempre que os bens sob constrição sejam essenciais ao negócio do devedor empresário. E determina a observância das convenções de arbitragem, mesmo se a empresa estiver em recuperação, bem como suspende as execuções trabalhistas contra responsável subsidiário ou pessoa física ou jurídica solidária, durante o período do Stay.[1]

IV. Vedação expressa da distribuição de lucros e dividendos no período de Recuperação Judicial.

V. Inclui regra tributária que afasta o limite de uso de prejuízos fiscais, para a determinação da base de cálculo do imposto de renda e da contribuição social sobre o lucro líquido em caso de ganho de capital derivado de alienações de bens em recuperação ou falência, salvo se o adquirente for empresa do mesmo grupo econômico.

VI. Cria procedimento simplificado de habilitação e de impugnação de créditos tributários na falência, com vistas a reduzir o tempo de conclusão dos processos de falência no Brasil consistindo, em termos gerais, na reserva de crédito após sua propositura até efetivo reconhecimento, ressalvando o fato de que o credor só poderá votar na AGC após a decisão de mérito prolatada pelo Juízo competente ..

VII. Permite o encerramento da recuperação judicial antes da homologação do quadro geral de credores (QGC) e proíbe a inclusão de credores retardatários, isto é, aqueles que perderam o prazo original de 15 dias para habilitar seus créditos, por meio de uma regra decadencial que impede a habilitação de créditos após três anos da sentença de falência.

VIII. Prazo máximo de 180 dias para a venda dos ativos da massa falida e consequente encerramento da falência. Visa dar celeridade ao procedimento falimentar.

IX. Permite substituir a AGC presencial por termo de adesão escrito ou por assembleia eletrônica, feita à distância.

X. Inclui os créditos, inclusive as multas, juros e encargos, das autarquias e das fundações públicas federais, dentre os sujeitos ao regime jurídico da transação, como consequência da Lava-jato.

XI. Amplia os meios de recuperação judicial, para permitir a capitalização de créditos, a troca de administradores e a venda integral da empresa sem assunção de dívidas pelo comprador, se os credores forem atendidos com as mesmas condições que teriam em caso de falência.

XII. Amplia (em prejuízo aos devedores) os requisitos para se fundamentar o pedido inicial de recuperação judicial, com exigência cabal de comprovação contábil acerca da crise econômico-financeira e dos meios financeiros de recuperação, inserindo 4 parágrafos no art. 48 da Lei.

XIII. Maximizada a vigilância sobre o devedor e seus administradores para evitar o esvaziamento de bens na recuperação, prevendo ainda o afastamento do devedor que descumprir compromissos contábeis.

XIV. amplia o prazo para 2 (dois) anos para pagamento dos créditos trabalhistas, contar da homologação do plano de recuperação judicial do devedor, desde que cumulativamente sejam a) apresentadas garantias julgadas como suficientes pelo Juízo, b) aprovado pelos credores em AGC e que c) garantam o pagamento da integralidade dos créditos trabalhistas na forma aprovada pela AGC. .

XV. Autoriza (em prejuízo aos devedores) os credores a apresentarem e a aprovarem plano próprio, mesmo contra a vontade do devedor, com prazo para a conclusão da deliberação em Assembleia suspensa, de acordo com as regras e quórum específico e, nesse caso, os credores encampam a administração da empresa devedora e, por razão de equilíbrio, os acionistas ou quotistas do devedor ficam exonerados de manter as garantias concedidas previamente aos credores da empresa devedora.

XVI. Adequação das 4 classes de credores em correção a Lei 11.101/2005.

XVII. Amplia a blindagem do adquirente das UPIs de forma mais abrangentes, considerando que não assumirá dívida alguma, mesmo se normas anticorrupção assim exigirem.

XVIII. A manutenção da empresa em recuperação judicial após a homologação do Plano dependerá única e exclusivamente do entendimento do magistrado competente, o qual poderá a qualquer momento encerrar a recuperação judicial, contudo limitando a prazo não superior de 2 anos já existentes.

XIX. Amplia (em prejuízo ao procedimento) as exigências para a venda de ativos não prevista no Plano de recuperação, acrescentando que os credores poderão impugnar a autorização dada pelo Juiz e decidir o tema em assembleia de credores [ou seja, o juiz autoriza e os credores tem poder para, se assim decidido pela AGC, impedir a alienação?].

XX. Regulamenta o dip finance, o que poderá auxiliar o devedor em crise profunda, mas cuja empresa for viável, a obter créditos de última hora, afastando-o do decreto de falência. Contudo, não autoriza o compartilhamento de garantias, tornando inócua a medida uma vez que impede que o juiz crie garantia subordinada sobre ativos já onerados por alienação fiduciária ou cessão fiduciária.

XXI. Regulamenta a consolidação Processual e Substancial, que se resume no caso da consolidação processual na união de processos de RJ ou falências de empresas do mesmo grupo econômico, permanecendo a votação individualizada para cada devedor. Já a consolidação Substancial , se resume na consolidação de passivos e ativos dos devedores integrantes do mesmo grupo econômico, após seja verificado pelo menos 2 requisitos a seguir: a)existência de garantias cruzadas; b) relação de controle ou de dependência; c) identidade total ou parcial do quadro societário; e d) atuação conjunta no mercado entre os postulantes..

XXII. Amplia o rol para autorizar o Juiz a decretar a falência do devedor em razão de descumprimento de pagamento em parcelamento de créditos tributários. A falência do devedor também será decretada se, vendida a sua empresa em sede de recuperação judicial, ocorrer a chamada “liquidação substancial”, hipótese de falência travestida de recuperação judicial com o intuito de fraudar credores e que ocorre quando não se preserva, na empresa Recuperanda, nenhuma atividade econômica capaz de gerar receitas ficando a critério do juízo tal análise. Por fim, autoriza o Fisco a pedir a convolação do processo de recuperação judicial em processo de falência, se o devedor der causa injustificada à rescisão de pacto de parcelamento ou de transação firmado ou não no decorrer da Recuperação Judicial.

XXIII. Altera a ordem de pagamento dos credores, com preferência para os créditos derivados de dip finance ofertados em recuperação judicial, restituições, encargos da massa falida, créditos trabalhistas limitados a 150 salários mínimos, créditos com garantia real, créditos tributários, créditos quirografários, créditos subordinados e créditos de juros contra o falido, extinguindo os créditos privilegiados. O procedimento, aparentemente já era aplicado na pratica, sem trazer novidades ou benefícios aos envolvidos no procedimento recuperacional.

XXIV. Criação e a divulgação do cadastro nacional dos falidos, com a manutenção dos dados e informações sobre as empresas, sócios e administradores em banco de dados publico e gratuito de todos os devedores falidos ou em recuperação judicial.

XXV. Cria a insolvência transfronteiriça, nos moldes da Lei Modelo da Uncitral e a chama de insolvência transnacional, para colaboração mútua em processos nacionais e internacionais.

XXVI. Alterações de regras tributárias relacionadas ao tratamento prescrito para empresário ou sociedade empresária em regime de recuperação judicial.

XXVII. Altera a recuperação extrajudicial para reduzir de 60% (sessenta por cento) para 50% (cinquenta por cento) a anuência necessária de credores a fim de se conferir efeitos abrangentes a todos os demais credores, mesmo os não anuentes. Permite que o devedor deduza pedido de recuperação extrajudicial com apoio de apenas 1/3 (um terço) dos credores, enquanto se aguarda a anuência de mais credores, a fim de se atingir 50% (cinquenta por cento) do total de credores. Ressaltamos que o stay period já vem sendo aplicado aos credores sujeitos aos efeitos da Recuperação Extrajudicial, aos não sujeitos permanece a mesma situação, não se suspendendo ou limitando direitos de ação.

XXVIII. Institui no procedimento a possibilidade de processuais da conciliação e da mediação no processo de recuperação e falência, com a criação de um mecanismo de suspensão de execuções contra o devedor, no período de 60 (sessenta) dias, a fim de fomentar sua composição com os credores, prazo este a ser abatido do stay period, caso a composição seja frustrada.

XXIX. Retira (em prejuízo ao devedor) do rol de créditos sujeitos à recuperação judicial aqueles créditos e/ou garantias vinculados às Cédulas de Produto Rural de liquidação física.

Esses são os pontos de relevância apontados pelo Relator do projeto, sendo que demais pontos serão trazidos em estudo completo e complementar ao PL 4.458/20, o qual vai para sanção presidencial.

 

[1] “Art. 6º A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial

implica:

I – suspensão do curso da prescrição;

II – suspensão das execuções ajuizadas contra o devedor, inclusive daquelas dos credores particulares do sócio solidário, relativas a créditos ou obrigações sujeitos à recuperação judicial ou à falência;

III – proibição de qualquer forma de retenção, arresto, penhora, sequestro, busca e apreensão e constrição judicial ou extrajudicial sobre os bens do devedor, oriunda de demandas judiciais ou extrajudiciais cujos créditos ou obrigações sujeitem-se à recuperação judicial ou à falência.

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