Por: Antonio Carlos Mazzucco
O texto final da Medida Provisória para a privatização da Eletrobrás foi encaminhado para a sanção presidencial, após tramitação no Congresso Nacional.
Para ser aprovado, o texto original foi emendado com matérias estranhas à proposta original, e na redação final, passou a constar “jabuticabas”.
Destaca-se a emenda que autoriza o Governo Federal construir o Linhão do Tucuruí, sistema de transmissão de energia que vai ligar Roraima ao sistema elétrico nacional, sem necessidade de licenças ambientais do Ibama e da Funai, medida que contraria todo o sistema de proteção ambiental para futuras gerações, uma vez que referida linha de transmissão passa por 122 quilômetros de território indígena, composto por 31 aldeias. O tema ganha relevância, pois a disposição é contraria a Convenção 169, da OIT[1], e, para referido projeto que afeta a população indígena, há a obrigação de participação da FUNAI no licenciamento ambiental.
Há, também, a prorrogação dos contratos das usinas construídas pelo Proinfa, o Programa de Incentivo às Fontes Alternativas de Energia Elétrica, com o objetivo de aumentar a participação da energia elétrica produzida por empreendimentos de Produtores Independentes Autônomos, concebidos com base em fontes eólica, pequenas centrais hidrelétricas e biomassa, no Sistema Elétrico Interligado Nacional. Tal medida gera custo adicional ao consumidor, uma vez que os custos do PROINFA são rateados entre todas as classes de consumidores finais atendidas pelo Sistema Elétrico Interligado Nacional.
A contratação de usinas termelétricas movidas a gás natural, que deverão estar instaladas nas regiões Norte, Nordeste, Centro-Oeste e Sudeste, para o fornecimento de 8 MW de energia por 15 anos, também encarecerá o custo da energia elétrica, que será bancado pelos consumidores. O encarecimento ocorrerá uma vez que as usinas movidas a gás estarão localizadas em redutos sem infraestrutura para o transporte de gás natural, devendo ser construído.
Outra emenda feita à Medida Provisória estabelece a reserva de mercado para contratação de Pequenas Centrais Hidrelétricas (PCHs), cuja construção e operação dependem apenas de autorização da Aneel (nos demais casos, há exigência de leilão para a concessão da exploração da queda d´água), no entanto, a produção não é controlada pela ONS (Operador Nacional do Sistema Elétrico), ou seja, as PCHs ficam expostas ao risco hidrológico, dificultando, portanto, o cumprimento do contrato.
Ademais, com a privatização, empregados demitidos até um ano após a privatização poderão ser realocados para outras estatais, mantendo, ou até mesmo, aumentando os gastos com servidores públicos por outras empresas públicas, bem como por ser o aproveitamento dos funcionários uma medida inconstitucional, conforme Súmula Vinculante nº 43[2].
Por isso, em que pese o Governo Federal considerar que a Medida Provisória seja benéfica devido ao aumento dos investimentos no País e ganho aos cofres públicos, entidades não governamentais ponderaram que a privatização onerará o custo da energia para o consumidor[3]. Sobre isso, ressalta-se, ainda, que além do aumento nas contas de luz, setores que possuem o insumo energia serão afetados gerando, mais uma vez, o aumento de bens de consumo em razão da privatização.
[1] Artigo 6º 1. Ao aplicar as disposições da presente Convenção, os governos deverão: a) consultar os povos interessados, mediante procedimentos apropriados e, particularmente, através de suas instituições representativas, cada vez que sejam previstas medidas legislativas ou administrativas suscetíveis de afetá-los diretamente; b) estabelecer os meios através dos quais os povos interessados possam participar livremente, pelo menos na mesma medida que outros setores da população e em todos os níveis, na adoção de decisões em instituições efetivas ou organismos administrativos e de outra natureza responsáveis pelas políticas e programas que lhes sejam concernentes; c) estabelecer os meios para o pleno desenvolvimento das instituições e iniciativas dos povos e, nos casos apropriados, fornecer os recursos necessários para esse fim. 2. As consultas realizadas na aplicação desta Convenção deverão ser efetuadas com boa fé e de maneira apropriada às circunstâncias, com o objetivo de se chegar a um acordo e conseguir o consentimento acerca das medidas propostas.
Artigo 7º 1. Os povos interessados deverão ter o direito de escolher suas, próprias prioridades no que diz respeito ao processo de desenvolvimento, na medida em que ele afete as suas vidas, crenças, instituições e bem-estar espiritual, bem como as terras que ocupam ou utilizam de alguma forma, e de controlar, na medida do possível, o seu próprio desenvolvimento econômico, social e cultural. Além disso, esses povos deverão participar da formulação, aplicação e avaliação dos planos e programas de desenvolvimento nacional e regional suscetíveis de afetá-los diretamente. 2. A melhoria das condições de vida e de trabalho e do nível de saúde e educação dos povos interessados, com a sua participação e cooperação, deverá ser prioritária nos planos de desenvolvimento econômico global das regiões onde eles moram. Os projetos especiais de desenvolvimento para essas regiões também deverão ser elaborados de forma a promoverem essa melhoria. 3. Os governos deverão zelar para que, sempre que for possível, sejam efetuados estudos junto aos povos interessados com o objetivo de se avaliar a incidência social, espiritual e cultural e sobre o meio ambiente que as atividades de desenvolvimento, previstas, possam ter sobre esses povos. Os resultados desses estudos deverão ser considerados como critérios fundamentais para a execução das atividades mencionadas. 4. Os governos deverão adotar medidas em cooperação com os povos interessados para proteger e preservar o meio ambiente dos territórios que eles habitam.
[2] É inconstitucional toda modalidade de provimento que propicie ao servidor investir-se, sem prévia aprovação em concurso público destinado ao seu provimento, em cargo que não integra a carreira na qual anteriormente investido.
[3] https://economia.ig.com.br/2021-06-18/eletrobras-privatizacao-custo.html; https://g1.globo.com/economia/noticia/2021/06/23/como-privatizacao-da-eletrobras-deve-encarecer-cerveja-carne-e-leite.ghtml; https://www.correiobraziliense.com.br/economia/2021/06/4932847-privatizacao-da-eletrobras-avanca-com-aprovacao-de-mp-na-camara.html