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Breves observações sobre o projeto de alteração da Lei de Recuperação Judicial e Falências

11 de fevereiro de 2019

 

Por Vitor Ferrari

O presente texto visa trazer à baila as discussões tratadas no Projeto de Lei (“PL”) que pretende alterar a Lei de Recuperação Judicial (“LRF”), em vigor desde 2005 e que vem servindo como útil ferramenta na manutenção das atividades das empresas endividadas, em virtude da crise política e comercial vivida nestes últimos anos.

As modificações trazidas a seguir relacionadas visam renovar o procedimento legal, fato que pode vir a atingir diretamente devedores e credores, beneficiários e afetos respectivamente, e, inclusive, atingindo a própria atuação do Magistrado na condução do processo.

Assim, em breve síntese destacamos alguns dos pontos de atenção discutidos no projeto que, se confirmados pelos legisladores, trarão consideráveis alterações ao procedimento recuperacional.

* Modificação na regra de competência – O projeto pretende concentrar as Recuperações Judiciais (“RJ”) nas capitais dos Estados da Federação, as quais, em tese, possuem varas especializadas com relação a matéria recuperacional e falimentar. Assim, caso a RJ possua um passivo superior a 300.000 (trezentos mil) salários-mínimos, hoje um valor de R$ 286 milhões, o feito tem como competente os foros especializados de suas capitais. Nitidamente tal determinação afeta sobremaneira devedores e credores, haja vista a necessidade de deslocamento para realização de atos e a total inobservância das dificuldades que serão impostas ao Juízo quanto a verificação do feito por seus agentes;

* Atos Oficiais e disponibilizados na Internet – Acertado o entendimento de que todos os atos devem ser disponibilizados na Internet, dando-se plena publicidade a todos os interessados. Contudo, frise-se que a disponibilização em si não pode e nem deve simplesmente substituir os atos Oficiais publicados nos Diários Oficiais, mas sim funcionar e integrar a informação de forma concomitante. Assim, em virtude do projeto, caso aprovado, os atos oficiais deverão ser disponibilizados e permanecer acessíveis em websites mantidos pelo Administrador Judicial de forma obrigatória;

* Alteração no início da contagem e aplicabilidade do stay period. Prazo de duração – A modificação da Lei visa que, o período de segurança contra ações e execuções concedido ao credor seja imediatamente aplicado no momento da propositura da Recuperação Judicial, fato que hoje depende do deferimento do processamento da Recuperação Judicial. Tal medida pode ser entendida de forma positiva, haja vista a necessidade de os Devedores, normalmente, dependerem do deferimento do processamento para, só aí, estancarem as medidas constritivas adotadas pelos credores. Ainda, mas não menos importante, é que, segundo o projeto, o período de 180 dias sai de cena, sendo que o stay period perduraria até o encerramento da Recuperação Judicial. Acreditamos que referido ponto acabará sendo modificado por pressão dos credores financeiros, haja vista que, mesclando os textos legais, todas as ações e execuções referentes a créditos anteriores a propositura da RJ (art. 6º da 11.101/05) resultaria na suspensão das medidas executórias de créditos até os 2 anos seguintes da aprovação do plano de recuperação (cf. art. 63 da 11.101/05).

* Alterações na forma da nomeação do Administrador Judicial (”AJ”) – Referido texto propõe que seja aberto verdadeiro procedimento de disputa entre os profissionais e empresas que atuam na área, sendo que a nomeação após referido procedimento pode vir a ser questionada por credores, pelo Devedor e pelo Ministério Público, cabendo ao Magistrado a nomeação com a fixação dos honorários. Assim, não somente o devedor poderia se opor a nomeação do AJ, ou a fixação de seus honorários, como também os credores, fato este que pode vir a resultar no crescimento exponencial de Recursos diante das Câmaras Especializadas dos Tribunais de Justiça de todo o País, pela simples discordância quanto a pessoa do AJ, ou mesmo a remuneração a ela atribuída.

Essa proposta tende a afastar profissionais gabaritados e experientes na área, os quais serão substituídos por empresas que, ao longo dos anos, já vem se massificando como Administradoras nas RJs por todo o País.

* Alterações quanto ao Plano de Recuperação Judicial – O projeto em si traz alterações ao procedimento legal como um todo, mas denota mais atenção ao quanto estabelecido no Plano de Recuperação Judicial, pois altera não somente o prazo de sua apresentação, majorando-o, como também inclui neste documento de suma importância a todo o procedimento a classificação dos créditos e dos credores. Ainda:

Prazo – Referido prazo de apresentação passaria de 60 para 90 dias corridos1 após a propositura da Recuperação Judicial;

Credores e Classificação dos Créditos – As classes como conhecidas são extintas pelo projeto, que estabelece que as classes serão definidas conforme estabelecido pelo próprio plano de recuperação judicial. De forma ainda não regular, a proposta ainda prevê que os credores de cada classe devem possuir interesses equivalentes, decorrentes da natureza ou importância do crédito, ou de critério estabelecido e justificado pelo devedor no momento da apresentação do plano, fato que deverá ser aprovado pelo Juiz.

Votação do Plano independeria da concordância do Devedor – Em total contrariedade ao que está estabelecido na Lei nº 11.101/05, caso se tenha encerrado o prazo legal sem que tenha sido realizada a assembleia geral de credores, abrir-se-ia a possibilidade de se colocar em votação plano que não obtenha a expressa concordância do devedor, ao nosso ver, em total desatenção ao estabelecido e resguardado pela LRF hoje. Contudo, seriam requisitos para tal votação: (A) conte com o apoio por escrito de credores que representem mais de um terço dos créditos totais sujeitos à recuperação e que tenham negociado de boa-fé; (B) não atribua obrigações novas aos sócios do devedor e (C) não implique sacrifício do capital dos sócios do devedor maior do que aquele que decorreria da liquidação na falência. Fato é que hodiernamente, tal previsão beneficia única e exclusivamente os credores financeiros, colocando em xeque os princípios legais da Recuperação Judicial.

* Redução dos Direitos do Devedor – Além do já mencionado quanto a possibilidade de votação de PLRJ sem a concordância do Devedor, o maior interessado na Recuperação Judicial, o Projeto de Lei ainda impõe proibição a distribuição de lucros ou dividendos da Companhia a seus sócios e administradores, primando pelo pagamento dos credores.

* Atualização monetária na Recuperação Judicial – De acordo com o projeto, os créditos sujeitos serão atualizados do pedido de recuperação até a concessão do plano de recuperação judicial, pelo índice da caderneta de poupança. Tal fato não ocorre hoje, haja vista que os créditos são congelados até a data da concessão da recuperação judicial.

Em que pese, os pontos acima, existem demais relevantes pontos que merecem uma atenção especial, os quais serão objeto de análise específica diante da importância quanto a sua afetação ao procedimento recuperacional. Pontos que precisam de atenção individual:

* AGC no Projeto de Lei (Nota);

* Voto Abusivo (Texto);

* Atos legais e prazos processuais no Projeto de Lei (Nota);

Assim, sem prejuízo a todo o exposto, podemos concluir que o Projeto apesar de inovador, trata com extrema frieza a questão da manutenção das atividades empresárias, tornando o procedimento de recuperação judicial como uma medida de simples redução de danos em curto espaço de tempo, não se atentando que a Recuperação de uma Empresa em nítida dificuldade financeira demanda de tempo para retomada de suas regulares atribuições e cumprimento de suas obrigações.

Referido projeto, caso prossiga nesse sentido, pode resultar em nítido prejuízo a todos os envolvidos, sejam devedores ou credores, além das demais pessoas afetas ao procedimento Legal, contrariando os princípios da preservação e manutenção da atividade econômica, insculpidos no art. 47 da lei 11.101/05.

Por fim, hoje o Projeto de lei se encontra em Regime de prioridade de tramitação Coordenação de Comissões Permanentes (CCP) da Câmara dos Deputados, sendo necessária a criação de comissão especial à matéria.

 

Esta comunicação, que acreditamos poder ser de interesse para nossos clientes e amigos da empresa, destina-se apenas a informações gerais. Não é uma análise completa dos assuntos apresentados e não deve ser considerada como aconselhamento jurídico. Em algumas jurisdições, isso pode ser considerado publicidade de advogados. Consulte o aviso de privacidade da empresa para obter mais detalhes.

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