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Mediação de conflitos societários – 1ª parte.

12 de fevereiro de 2019

 

Por Fabio Marques

Conflitos empresariais envolvem o empresário e a atividade empresária no contexto da empresa, entre sócios ou com terceiros. Em linguagem jurídica, diz-se que a o conflito de interesses se caracteriza pela pretensão resistida de qualquer das partes, fazendo nascer o direito subjetivo, e, em consequência a pretensão de direito que será exercida mediante o direito de ação.

Os conflitos entre os sócios afetam de forma grave as empresas, algumas vezes forçando a interrupção da atividade empresarial, eventualmente situações forçadas por liminares da Justiça, ou com a dissolução parcial da sociedade e a obrigação do sócio remanescente ao pagamento do valor das quotas do sócio que se retira da sociedade pela quebra da affectio societatis, onerando o sócio e a sociedade.

Não obstante a tensão natural e permanente da relação entre sócios – tensão que está presente em todas as relações jurídicas e que tem origem nas diferentes pretensões – não é incomum encontrar nos contratos sociais cláusulas que regulamentam a retirada de sócios, ou, sucessão dos sócios, redigidas de forma simples e protocolares, como se esta situação jamais fosse ocorrer.

Não raro, estas cláusulas contêm expressões vagas sobre a forma de apurar o valor da participação do sócio e sobre a forma de pagamento, o que gera problemas entre os sócios e impõe às partes a interpretação judicial das cláusulas, que não atenderá aos interesses destas mesmas partes.

Quando feita em processo judicial, a apuração da participação societária é feita por meio de procedimento que apura o valor do patrimônio líquido societário e o fundo de comércio – quando existente – o que implica dizer que o valor patrimonial não será considerado nestas situações, gerando frustrações ao sócio que se retira, ou, ao contrário, criando obrigação muito alta ao sócio que permanece na sociedade, agora obrigado a pagar também pela participação do sócio que decidiu se retirar.

Na ação de dissolução parcial de sociedade, por exemplo, basta o sócio que pretende se retirar argumentar com o fim do que se chama de affectio societatis, ou afeição social – numa tradução bem defeituosa, mas que é comum em livros doutrinários- e que designa a vontade de permanecer sócio e a boa relação entre os sócios, para que o Juiz autorize a sua retirada da sociedade mediante despacho liminar, seguindo o processo com objetivo de apuração do valor participação societária.

Em algumas situações mesmo as cláusulas redigidas sob orientação profissional em um determinado momento da vida societária e econômica da empresa, podem não surtir o efeito que dela se esperava quando da sua redação, muitas vezes elaborada muitos anos antes.

Com todos estes problemas e, mais, com a já conhecida lentidão do poder judiciário em resolver os processos, e a certeza de que a decisão judicial desagradará as duas partes, a possibilidade de os sócios resolverem estas questões por meio da mediação de conflitos surge como a melhor solução à disposição dos sócios para resolver as questões da relação societária.

A atividade de mediação tem previsão na Lei 13.140/15 e o texto legislativo – não obstante a desnecessidade de legislação para este tipo de atividade – elucidou princípios que deveriam estar presentes na atividade de mediação.

Não é função da lei enumerar princípios que decorrem da atividade interpretativa doutrinária e jurisprudencial, o que poderá levar em muitas situações a uma contradição entre os princípios eleitos pela Lei e os princípios advindos da atividade de interpretação do Direito, construídos ao longo dos anos e que transpiram do Direito.

Além disto, sabemos que princípios são espécies normativas aplicadas concretamente pelo método de preponderância, a partir da interpretação que feita no caso concreto e, assim, em algumas situações a preponderância principiológica poderá indicar a sobreposição de outro princípio que não um daqueles eleitos pela Lei, gerando não apenas um conflito – não apenas de preponderância – mas legislativo e métodos de interpretação do Direito, ante a regra comum de que o especial prefere o geral.

Por fim, apenas para completar esta crítica, a atividade de interpretação jurídica – doutrinária e jurisprudencial – é atividade em movimento que se atualiza, acha novos sentidos para normas e princípios jurídicos, enquanto a Lei é estática e não se atualiza.

Com esta dimensão é que se diz que o artigo 2a da Lei 13.140/15 enumera os seguintes princípios que orientam a atividade de mediação: (a)imparcialidade do mediador; (b) isonomia entre as partes; (c) oralidade; (d) informalidade; (e) autonomia da vontade das partes; (f) busca do consenso; (g) confidencialidade; (h)boa-fé. 

Todos estes princípios já estão elucidados e discutidos pela atividade doutrinária, e vem sendo aplicado de forma intensa na interpretação jurisprudencial para a atividade processual e para o direito privada de uma forma geral.

Imparcialidade do mediador é premissa da atividade de mediação que advém do princípio da isonomia, isto é, do direito das partes de receber o mesmo tratamento por parte do conciliador. O princípio da isonomia tem matriz constitucional, e está previsto pelo artigo 5º, e se constitui valor garantido na Lei Fundamental que se refere à igualdade das pessoas perante a Lei.

Os princípios da oralidade; (d) informalidade; (e) autonomia da vontade das partes; (f) busca do consenso, são também princípios do direito processual civil, e o principio da autonomia da vontade, ou, como se diz, autonomia privada, é principio geral de direito.

A confidencialidade inserida na Lei como princípio se opõe a outro princípio do processo civil que se refere à publicidade dos atos com regra geral, embora a confidencialidade esteja também presente na Lei de arbitragem, e aparece no contexto da mediação como uma vantagem adicional das partes que não tornarão pública as razões do conflito, as suas vísceras societárias, o que ocorrerá se a questão for tratada em foro público.

Por fim a boa-fé que também é princípio geral de direito. No caso da Lei 13.140/15 a boa fé subjetiva deverá ser observada pelas partes, mas também é possível entender que a Lei quis se referir à boa fé objetiva, já muito estudada e entendida pela doutrina e pela jurisprudência e que se revela na confiança, honestidade das partes.

De todos estes princípios, a confidencialidade imposta a ambas as partes e ao conciliador aparece como grande ativo das partes ao se submeterem a este tipo de procedimento.

Em relação a mediação, é necessário dizer que mediar significa formular propostas de acordo entre as partes a partir da narrativa de cada, e que esteja equilibrada.

Quando duas partes pretendem e disputam o mesmo direito e optam pela solução judicial irão receber ao final uma decisão em que o julgador fará a subsunção dos fatos ao direito e, neste caso, declarará a vitória de uma das partes, ainda que a vitória seja parcial.

Vencer uma ação, contudo, não significa necessariamente ver a pretensão manifestada originalmente acolhida pelo Juiz, pois entre a pretensão e a decisão há um mar de variáveis, inclusive o tempo que atua como limitador de pretensões, e, nas querelas societárias impõe serias perdas à empresa e aos sócios.

O procedimento societário torna obrigatória a presença das partes à primeira reunião de mediação, se previsto em contrato, conforme dispõe o § 1º do artigo 1º da referida lei.

Os métodos utilizados para a mediação têm diferentes origens, mas passam, necessariamente, pela transparência do mediador em mostrar as partes o conflito com os argumentos dos dois lados.

Ao mostrar o conflito com os argumentos antagônicos, o mediador está chamando as partes à reflexão dúplice, ao cálculo de ganhos e a adicionar a estes cálculos o fator tempo. Não é difícil entender, assim, que uma mediação quando bem feita tende a apresentar resultados muito melhor que os demais métodos de resolução de conflitos.

Uma ultima observação é necessária: a conciliação não significa que cada uma das partes em conflito registre uma perda em relação às suas pretensões: qualquer conciliação em que as partes decidam com base nesta premissa será ruim, isto, porém, não significa dizer que as partes devem reconhecer com clareza e objetividade os limites de suas pretensões, e que tais limites podem estar dimensionados em pontos diferentes daquele que usualmente estimaram.

 

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