Por Vitor Antony Ferrari / Antonio Carlos C. Mazzucco
Diante do atual cenário de crise política e econômica imposta por uma gestão pública equivocada e populista, as Empresas brasileiras e seus administradores vêm enfrentando inúmeras dificuldades para cumprir com suas obrigações junto aos seus credores, sejam eles fornecedores, instituições financeiras e até mesmo seus empregados, em especial as Microempresas e Empresas de Pequeno Porte.
Em linhas gerais e antes mesmo de adentrarmos ao tema, ressaltamos que a Lei das Microempresas e Empresas de Pequeno Porte instituída em 2006 prevê como critério de regime a receita bruta das sociedades. Assim resta definido que a Microempresa será a sociedade empresária, a sociedade simples, a empresa individual de responsabilidade limitada e o empresário, devidamente registrados nos órgãos competentes, que aufira em cada ano calendário, a receita bruta igual ou inferior a R$ 360.000,00.
Caso a receita bruta anual da Empresa seja superior a R$ 360.000,00 e igual ou inferior é
R$ 3.600.000,00, a sociedade será enquadrada como Empresa de Pequeno Porte. Estes valores referem-se a receitas obtidas no mercado nacional. A empresa de pequeno porte não perderá o seu enquadramento se obter adicionais de receitas de exportação, até o limite de
R$ 3.600.000,00.
Retomando o tema, em um passado não tão distante, a crise financeira vividas pelas empresas brasileiras resultava, inevitavelmente, em 02 (duas) alternativas, quais sejam: a) a Concordata, que acabava sendo uma liquidação de ativos da Empresa com o alongamento do prazo para quitação dos débitos junto aos credores quirografários (ou simplesmente aqueles que não possuem qualquer tipo de garantia); e, b) a falência, que era, e ainda é, a grosso modo, uma execução coletiva.
Esses amargos remédios não beneficiavam e nem garantiam aos credores o recebimento de seus créditos, e muito menos garantiam aos devedores a manutenção de seus negócios e até de seu patrimônio, levando-os muitas vezes à bancarrota. Tal insegurança e ausência de fato que muitas vezes resultava em um efeito dominó, atingindo todas as categorias da cadeia produtiva das Empresas afetas, prejudicando fornecedores, empregados e instituições financeiras.
Com a necessária evolução e atualização legislativa, adequando-se, e atendendo as suplicas das instituições financeiras que ansiavam para ter garantias a fim de vender seus produtos (o crédito), o modelo adotado pelo Decreto-Lei de 1945, e que perdurou até 2005 foi substituído pela Lei n.0 11.101/2005, que revogou o instituto da Concordata, tornando menos traumática a resolução dos problemas do devedor, bem como concedendo esperança aos credores do recebimento de seus créditos.
A Lei de Recuperação Judicial tem insculpido em seu art. 47 seu conceito fundamental, que prevê a superação, manutenção e viabilidade da empresa e dos empregos. Assim, o artigo mencionado prevê que:
A recuperação judicial tem por objetivo viabilizar a superação da situação de crise econômico-financeira do devedor, a fim de permitir a manutenção da fonte produtora, do emprego dos trabalhadores e dos interesses dos credores, promovendo, assim, a preservação da empresa, sua função social e o estímulo à atividade econômica.
Desta forma, as Empresas devedoras passaram a contar com as seguintes possibilidades para o soerguimento de suas atividades, dos quais cabem mencionar:
- Dilação do prazo ou revisão das condições de pagamento, na qual a chance de reorganização é representada com o abatimento no valor de suas dívidas ou o aumento do prazo de vencimento. Este é o meio que mais se aproxima do instituto da concordata preventiva, se diferenciando, pois vincula os credores de maneira geral e não apenas os quirografários, como ocorria na concordata; ausência de prazos máximos e percentuais mínimos na recuperação judicial.
- Operações societárias – cisão, incorporação, fusão, transformação – cabendo ao devedor contextualizá-las num plano econômico que mostre como sua efetivação poderá acarretar as condições para o reerguimento da atividade.
- Alteração total ou parcial do controle societário. No primeiro caso, opera-se a venda do poder de controle; no segundo, a admissão de novo sócio no bloco controlador.
- Reestruturação da administração, já que geralmente, o motivo das dificuldades econômicas é a falta de condições ou competência para os administradores realizarem cortes de pessoal e de despesas, modernizarem o estabelecimento empresarial ou aperfeiçoarem os recursos disponíveis.
- Transferência ou arrendamento do estabelecimento, que significa à venda do estabelecimento para alguém com condições melhores de explorar a mesma atividade econômica de modo mais competente, ou a direção da atividade econômica passa as mãos de arrendador que está em melhores condições de promover sua recuperação.
- Usufruto de empresa, destinada a transferir a direção da atividade econômica em crise para alguém mais preparado e competente. O novo dirigente torna-se usufrutuário do estabelecimento empresarial, revertendo em seu benefício os frutos da exploração deste.
Em que pese os benefícios trazidos pela Lei recuperacional, fato é que sua aplicação pratica da legislação para certas empresas e empresários, em especial as Microempresas e Empresas de Pequeno Porte era de difícil concretização, uma vez que lhe era imposto, obrigatoriamente, a adoção de um plano de Recuperação Judicial Especial.
Isso se dava pelo fato de que o procedimento junto ao Judiciário possuía, além dos custos elevados do processo, a opção por um plano idêntico ao da antiga concordata, que limitava o meio adotado para a recuperação apenas ao parcelamento do pagamento somente dos créditos quirografários, com a obrigatoriedade de aplicação de juros sobre os créditos, mesmo de forma limitada, o que muitas vezes não seria a melhor forma de recuperação para a Microempresa ou Empresa de Pequeno Porte.
Sendo assim, visando atender essa parcela de empresas que movimenta grande fatia do PIB nacional já que conta com mais de 9 milhões de empresas registradas, foi promulgada a Lei Complementar 147/2014, com o escopo de conceder a estas empresas todos os benefícios da Lei Recuperacional.
Em vias práticas, as Micro e Pequenas Empresas podem se beneficiar da utilização de um Plano de Recuperação Especial, como também poderão adaptá-lo de forma que lhes traga o efetivo proveito para continuidade de sua atividade econômica, a manutenção dos empregos e o pagamento de seus compromissos dentro dos prazos estabelecidos e aprovados por seus credores.
Assim, as Micro e Pequenas Empresas, desde que cumpridos os requisitos mínimos para propositura de sua recuperação (art. 48 da lei), poderão agora sujeitar todos os créditos, independente de classe, existentes na data do pedido mesmo que ainda não vencidos, sendo-lhe permitido ofertar deságio de crédito para recebimento.
O Plano no regime Especial permanece parcelado em 36 (trinta e seis) meses, porém com uma taxa SELIC para atualização dos valores, tornando-se muito mais atrativa do que o sistema anterior. Ainda, o Plano Especial concederá o benefício de que o Micro ou Pequeno Empresário não passe pela necessidade da Assembleia Geral de Credores.
Contudo, cabe ressaltar que se houver objeção ao plano de mais da metade dos credores de quaisquer classes, que deverão ser computados nos termos do artigo 45, ou seja maioria de créditos e de credores nas classes de garantia real e quirografários, e maioria simples independentemente de valor de crédito das classes trabalhistas e Micro e Pequenas Empresas (nova classe de credores também inserida pela LC 147/2014), o juiz julgará o pedido improcedente e decretará a quebra da empresa.
Assim, é importante que o Micro e Pequeno Empresário, ao escolher o procedimento do Plano Especial esteja bem amparado por seus patronos, que deverão sempre passar um panorama de interesses em comum com os credores, com o escopo de que seja realizada tal opção.
Por fim, os benefícios trazidos pela Lei Complementar 147/2014 não se limita às Recuperandas, mas também traz vantagens e diferenciações aos Micro e Pequenos Empresários que são credores nas Recuperações Judiciais. Um desses benefícios é a equalização de seu direito de voto na Assembleia não pelo valor do seu crédito (o que normalmente afastava o credor de qualquer decisão de seu interesse) mas sim “por cabeça”. Seu direito de voto foi valorizado, tornando-o peça importante no tabuleiro da Recuperação Judicial.
Conclui-se que as alterações foram proveitosas e permitem o melhor acesso a justiça, a continuidade do negócio e a manutenção do emprego.