Por: Vitor Antony Ferrari e Ivan Kubala
Prevista na Lei 11.101 (Lei de Recuperação de Empresas e Falências) e alterada pela Lei 14.112/20, a presente medida consiste na suspensão das execuções para que o devedor possa negociar com seus credores, evitando o ajuizamento da Recuperação Judicial.
Nesse procedimento há necessidade de apresentação de documentos, e se sim, quais? Há suspensão de quais processos? Quem serão as partes envolvidas? Qual o posicionamento do Judiciário sobre a questão? – Veja, são muitos os questionamentos. Vamos tratar do tema ao que interessa ao Empresário que pode vir a se valer do procedimento para tratar especificamente de alguns credores ou grupo de credores.
Inicialmente, cabe esclarecer que no decorrer da pandemia pensou-se que o judiciário brasileiro seria inundado com pedidos de RJ devido à crise financeira gerada pela covid-19.
A fim de mitigar os números desses pedidos, foi realizada uma mudança na lei de RJ, o artigo 20-B, na busca de uma saída extrajudicial para a solução desses conflitos. Todavia, apesar do intuito positivo, a medida foi criticada pelo meio Jurídico, uma vez que se trata de uma medida cautelar realizada no próprio judiciário, o que incentiva as medidas judiciais, e vai de encontro com o desafogamento do judiciário, em especial das Varas Especializadas.
Mas como medida cautelar, é necessário juntar todos os documentos previstos na Lei?
O ideal é que a documentação seja apresentada, para demonstrar aos interessados que não se tendo êxito em uma negociação prévia, o devedor ainda poderá optar pelo processo principal, ou seja a própria Recuperação Judicial.
Essa medida é drástica, vez que suspende os atos executivos e constritivos dos créditos envolvidos na mediação. Sendo assim, deve-se entender o artigo 20-B de forma restrita, caso contrário haverá uma situação em que diversos credores terão seus créditos suspensos, mesmo que não estejam negociando com o devedor.
De acordo com pensamento da magistratura paulista, os requisitos para o deferimento da cautelar devem ser estritamente observados antes da tutela ser concedida.
Nessa linha, a simples necessidade de suspender as execuções e impossibilitar que a empresa em dificuldades seja ré de mais ações judiciais não é o bastante para a concessão da medida suspensiva, vez que todo devedor argumenta sua necessidade com base neste fato. É preciso algo além, um verdadeiro perigo de dano irreparável.
Novamente, o dispositivo, feito às pressas, é dúbio, pois abriu margem quanto a eficácia da tutela que defere a suspensão, gerando discussões se essa vale para todos os credores ou somente os processos de mediação em curso.
O Judiciário vem interpretando a norma de forma literal, aplicando a suspensão para as ações que empresa está respondendo, englobando assim créditos que estão sendo negociados ou não.
Fato é que a simples suspensão das ações contra a empresa é mais uma ferramenta para trazer os credores a sentarem e negociarem com a empresa antes de entrar no judiciário para solver a questão e responder um longo processo de Recuperação Judicial.
Contudo, a suspensão de processos envolvendo todos os credores, resultaria na necessidade de uma negociação coletiva em um curtíssimo espaço de tempo, e diante de sua figura processual, em tese haveria problemas em sua aplicação, gerando uma série de recursos e medidas colaterais, uma vez que um procedimento cautelar (que visa garantir um resultado útil de uma demanda futura) não pode exceder os limites do processo principal, e nem limitar direitos de terceiros que não estejam participando das negociações.
Quanto ao prazo previsto na lei, é de consenso que este é insuficiente para que haja todas as negociações, tendo em vista que a RJ, mais complexa, possui 180 dias prorrogáveis por mais 180. Apenas 60 dias é muito pouco.
Além disso, entende-se que não há a possibilidade de prorrogação do referido prazo, tendo em vista as opções do devedor em prosseguir com o procedimento recuperacional ou extinguir a cautelar.
A prorrogação poderia se tornar uma blindagem patrimonial para o devedor, desvirtuando o sentido resolutivo e mediador do instituto.
Caso não seja possível uma resolução dentro do prazo, o devedor deve se socorrer à RJ ou RE.
Por fim, com relação a lista de credores, é necessário apresentar todos aqueles dispostos a negociar seus créditos. Todavia, caso não haja acordo e então seja necessário partir para um RJ ou RE, um novo processo deverá ser iniciado, porém, abatendo-se do “stay period” (suspensão de 180 dias) o tempo de suspensão já decorrido no procedimento cautelar. Além disso, é altamente recomendado que se atualize a lista de credores na opção de algum novo procedimento, a fim de se evitar problemas dentro do novo processo.
A ideia de mudar a Lei 11.101 foi importante a fim de trazer mais celeridade e dinamicidade à resolução destes conflitos sem que seja preciso envolver o Poder Judiciário. Entretanto o texto legal foi mal redigido, criando dúvidas que ameaçam a segurança jurídica do tema, sendo necessário que haja pacificação dos pontos controvertidos para que o mecanismo opere de forma eficaz.
Com colaboração de Luís Felipe Meira Marques Simão.