Por: Vitor Antony Ferrari e Ivan Kubala
No Brasil tem se consolidado o entendimento de que um herdeiro pode sim usucapir imóvel da herança, desde que seja preenchido todos os requisitos legais, ou seja, a despeito de existir esse direito, não significa que se um herdeiro permanecer no imóvel objeto de herança por certo período conseguirá, automaticamente, a usucapião.
Normalmente, o herdeiro que permanece na posse de um bem exercerá mera detenção, isto quer dizer, embora seja dono, como há outros proprietários (outros herdeiros) — relação de condomínio legal pro indiviso art. 1.791, parágrafo único, do CC/02) —, presume-se que estes apenas lhe deram uma permissão precária de ocupação, sendo que esta pode ser revogada a qualquer momento.
Com efeito a partir do falecimento do autor da herança o patrimônio transmite-se aos herdeiros, de modo que todos se tornam possuidores e proprietários até que se faça a partilha. No entanto, o herdeiro que permanecer na posse de um imóvel objeto da herança, não pode ficar à mercê dos demais herdeiros, principalmente quando estes simplesmente deixam de usar, dispor ou gozar do bem, inclusive criando óbices a abertura de inventário e à partilha de bens.
Neste contexto, aquele que exercer a posse mansa e pacífica do imóvel da herança, como se fosse dono exclusivo do bem, pelo prazo definido em lei, sem oposição dos demais herdeiros, deve ser considerado legítimo proprietário da coisa.
Como visto, para que tal fenômeno seja reconhecido, é necessário o preenchimento dos requisitos formais do art. 1.238 do CC/02, que são:
- A posse mansa e pacífica do bem;
- A posse ininterrupta por mais de 15 anos;
- A dispensa do justo título e da boa-fé.
Dessa maneira, basta que o herdeiro possuidor exerça a posse sobre o bem imóvel, com animus domini, sem oposição de terceiros, pelo prazo de 15 anos (ininterrupto, conforme dito acima), para que assim haja o reconhecimento da usucapião extraordinária, com a aquisição da propriedade pelo herdeiro.
O entendimento já possui posicionamento favorável de duas Turmas (Terceira e Quarta) do Superior Tribunal de Justiça (STJ)[1], mas os Tribunais Estaduais ainda possuem divergências quanto à matéria.[2]
De fato, trata-se de questão sensível que envolve institutos distintos (usucapião e herança), de modo que dependerá sempre da análise do caso concreto. Em razão disto e da novel modalidade extrajudicial, o interessado deve encontrar uma resistência maior por parte dos Tabeliões de Notas e dos Oficiais de registro de imóveis em aceitar a usucapião administrativa de imóvel objeto de herança, razão pela qual recomenda-se a orientação de profissionais que atuam na área para análise e melhor direcionamento do caso.
[1] REsp 1631859/SP e AgInt no AREsp 1527409/RN
[2] Apelação 1002215-34.2014.8.26.0068