Por: Vitor Antony Ferrari e Ivan Kubala*
A aplicação do IGP-M (índice geral de preços – mercado) tem sido amplamente discutida em razão do acúmulo desproporcional que o índice vem apontado desde o ano de 2020, o que tem gerado aumento de demandas judiciais visando a substituição desse índice por um menos oneroso, principalmente em casos envolvendo contratos de locação residencial e não residencial.
A controvérsia reside nos seguintes pontos:
(1) A favor:
(1.1) Onerosidade excessiva que resulta em desequilíbrio entre as partes (artigo 480 do Código Civil), que deve ser reestabelecido por meio da aplicação de um índice que reflete melhor a inflação;
(1.2) Acúmulo desproporcional do IGP-M consiste em fato imprevisível (artigo 317 do Código Civil)
(2) Contra:
(2.1) A escolha do índice decorre da livre manifestação de vontade das partes (artigos 421 e 421-A do Código Civil e artigo 17 da Lei do Inquilinato), que possuem conhecimento que se trata de índice com maior volatilidade;
(2.2) O contrato faz lei entre as partes (pacta sunt servanda)
Há ainda um outro ponto que, a despeito de não se inserir no contexto em debate, também pode ser utilizado de forma complementar, reforçando os argumentos a favor da substituição do índice, qual seja, a vedação da vinculação do aluguel à variação cambial prevista na Lei do Inquilinato (Lei n. 8.245/1991) na medida em que o IGP-M é bastante impactado pelo câmbio.
Nossa percepção é que existem mais precedentes favoráveis nos Tribunais do que desfavoráveis, mas há ainda o fator “caso concreto” que não pode ser desprezado e possui grande peso nas decisões do Poder Judiciário
A título de exemplo da controvérsia sobre a questão, abaixo citamos dois precedentes do mesmo Tribunal de Justiça:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. Locação residencial. Abordagem revisional. Arguição de desequilíbrio econômico do contrato, a partir de indexador de reajuste (IGPM), a refletir índice abusivo, bem superior a outros indicadores de inflação. Pleito para concessão de tutela de urgência, com momentânea alteração do indexador, para IPCA. Recurso do autor. Provimento. (TJSP; Agravo de Instrumento 2138874-96.2021.8.26.0000; Relator (a): Carlos Russo; Órgão Julgador: 30ª Câmara de Direito Privado; Foro de São José dos Campos – 7ª Vara Cível; Data do Julgamento: 18/08/2021; Data de Registro: 18/08/2021)
AÇÃO REVISIONAL – LOCAÇÃO DE ESPAÇO EM SHOPPING CENTER – TUTELA PROVISÓRIA DE URGÊNCIA PRETENDENDO SEJA AFASTADA A APLICAÇÃO DO IGPM E UTILIZADO O IPCA PARA FINS DO ÚLTIMO REAJUSTE DO VALOR DO ALUGUEL MÍNIMO – INDEFERIMENTO – POSSIBILIDADE – AUSÊNCIA DOS REQUISITOS LEGAIS DE VEROSSIMILHANÇA E RISCO IMINENTE DE DANO – MANUTENÇÃO DA DECISÃO POR PRUDÊNCIA EM SE AGUARDAR A INSTAURAÇÃO DO CONTRADITÓRIO PARA MELHOR APRECIAÇÃO DA QUESTÃO AGRAVO DESPROVIDO (TJSP; Agravo de Instrumento 2165120-32.2021.8.26.0000; Relator (a): Andrade Neto; Órgão Julgador: 30ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional IX – Vila Prudente – 4ª Vara Cível; Data do Julgamento: 17/08/2021; Data de Registro: 18/08/2021)
Em arremate vale destacar, ainda, que há um Projeto de Lei (PL 1026/2021) em trâmite na Câmara dos Deputados, que visa estabelecer que o índice de correção dos contratos de locação residencial e comercial não poderá ser superior ao índice oficial de inflação do País – IPCA, bem como uma Ação de Descumprimento de Preceito Fundamenta (ADPF) que tramita no Supremo Tribunal Federal sob o nº 869, também questionando a substituição do IGP-M por outro índice.
Entretanto, apesar do aparente cenário favorável aos inquilinos, a recomendação é sempre negociar com os locadores antes de judicializar a questão, sendo importante mesmo na fase pré-litígio ou negocial contar com a assessoria jurídica para uma análise detalhada do caso, onde serão observados todos os pontos essenciais para composição ou eventual Ação Judicial.