Por Rafael Mello – 03/04/2020
No dia 01/04/2020 foi editada pelo governo Brasileiro a Medida Provisória 936 (MP 936/2020), que “institui o Programa Emergencial de Manutenção do Emprego e da Renda e dispõe sobre medidas trabalhistas complementares para enfrentamento do estado de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6, de 20 de março de 2020, e da emergência de saúde pública de importância internacional decorrente do coronavírus (covid-19), de que trata a Lei nº 13.979, de 6 de fevereiro de 2020, e dá outras providências.”.
A medida trata de conferir parâmetros excepcionais e temporários, em especial com relação aos 3 temas que seguem: (i) Redução de Jornada com Redução de Salário (25%, 50% ou 70%), (ii) suspensão do contrato de trabalho por período máximo de 60 dias (layoff), (iii) benefício ao trabalhador via seguro desemprego quando há redução de superior a 25% ou suspensão do contrato.
Importante destacar que as medidas a seguir comentadas aplicam-se excepcionalmente no período de calamidade pública reconhecido pelo Decreto Legislativo nº 6 de 2020, tendo sido tal fato declarado pela MP 936/2020.
A MP 936/2020 ainda será objeto de muitos debates políticos e jurídicos.
A Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (ANAMATRA) publicou nota pública em 02/04/2020 em que destaca entendimento sobre itens inconstitucionais da MP 936/2020, a saber:
- A insistência na previsão de acordos individuais para tratar da crise e afastamento de negociação sindical (art. 7º, XXVI, da CF/88)
- Distinção entre trabalhadores hipossuficiente e “hipersuficientes” em afronta ao princípio da isonomia (art. 3º IV, da CF/88);
- Afastamento de caráter remuneratório de valores pagos e rebaixamento salarial.
Na mesma linha, a Associação Nacional dos Procuradores do Trabalho (ANPT) divulgou nota pública também no dia 02/04/2020 na qual aponta que, a pretexto de enfrentar a crise decorrente da COVID-19, o Governo Federal “submeteu o trabalhador brasileiro a situação de profundo abandono social, reduzindo drasticamente suas garantias trabalhistas no período, sem nenhuma contraprestação patronal e estatal”.
A ANPT destaca, ainda, preocupação com o afastamento da negociação coletiva e com as disposições da MP 936 em seus “arts. 2º, 7, II, 8º, § 1º, 9º, § 1º, I, e 12, que autorizam a flexibilização de direitos trabalhistas extremamente sensíveis no período de calamidade pública, mediante simples acordo individual entre empregado e empregador, caminhando em sentido diametralmente oposto ao patamar civilizatório projetado pela Constituição de 1988”.
Associações de advogados também se manifestaram de forma semelhante, como foi o caso do Instituto dos Advogados Brasileiros (IAB), sendo certo, ainda, que a tendência é que a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) também manifeste posição de cautela quanto a referida MP 936/2020.
O partido político REDE SUSTENTABILIDADE ajuizou a Ação Direta de Inconstitucionalidade n.º 6.363 (ADI nº 6.363) perante o Supremo Tribunal Federal também no dia 02/04/2020 com fundamento e argumentos similares aos suscitados pela ANAMATRA e ANPT. O processo encontra-se pendente de decisão liminar desde sua distribuição no gabinete do Ministro Ricardo Lewandowski, ainda sem decisão[1].
Nota-se, pois, que a aplicação da MP 936/2020, bem como da sua antecessora e complementar MP 927/2020, passa longe de conferir às empresas qualquer segurança jurídica, somando-se a isso o processo legislativo a que se submetem as medidas provisórias e o ambiente de instabilidade política instalado no país, como é notório.
A despeito das divergências sobre o tema e dos desafios que decorrem da crise pela qual o país passa e da aplicação dos instrumentos previstos na MP 936/2020, resta elencar as principais medidas, a título informativo.
Abaixo destacamos 2 premissas essenciais da MP 936/2020:
- A MP 936/2020 exime a empresa de negociação com o sindicato para implementação de suas medidas de layoff e redução de jornada e salarial, com exceção de negociação com empregados que recebam entre R$ 3.135,01 e R$ 12.202,11 de salário que deverão ser feitas pela via sindical.
- A aplicação das medidas de contenção de crise previstas na MP 936/2020 acarreta, como contrapartida ao empregado e que independe de negociação, a garantia provisória de seu emprego após o término da suspensão do contrato de trabalho ou da redução de jornada e salário pelo mesmo prazo que perdurou a medida restritiva.
Com essas premissas em mente, vejamos os 2 principais temas tratados na MP 936/2020.
- Redução proporcional de jornada e salário – Através de acordo individual ou coletivo (com sindicato) pode ser ajustada a redução da jornada em 25%, 50% ou 70% com respectiva e proporcional redução do salário. O Governo concederá aos empregados 25%, 50% ou 70% do valor do seguro-desemprego respectivamente ao percentual de redução de jornada/salário.
- Suspensão temporária do contrato de trabalho – layoff – Conforme explicitado acima, a MP 936/2020 permite a suspensão do contrato de trabalho por um prazo máximo de 60 dias (layoff) que pode ser fracionado em até dois períodos de 30 dias. Durante o layoff (i) a empresa com receita bruta até 4,8 milhões de reais pode optar em pagar uma ajuda de custo ao empregado com natureza indenizatória (não tem natureza salarial, e (ii) a empresa com receita bruta superior a 4,8 milhões de reais está obrigada a pagar uma ajuda de custo ao empregado equivalente a 30% do seus salário e tal valor terá natureza indenizatória (não tem natureza salarial).
Entendemos que a MP 936/2020 traz medidas excepcionais e que devem ser praticadas sempre com o objetivo de manutenção dos empregos.
O uso das medidas em contexto diferente deste, ainda que no período de calamidade, certamente irá gerar desdobramentos judiciais futuros com consequências ainda incertas.
Considerando, ainda, as manifestações públicas de entidades de classe da magistrados, procuradores do trabalho e advogados, a recomendação é que a implementação de quaisquer das medidas previstas na MP 936/2020, assim como recomendamos em relação à MP 927/2020, sejam juridicamente avaliadas antes de sua adoção.
Mazzucco & Mello Advogados está pronto para dar suporte aos seus clientes visando adotar medidas de forma ponderada e mitigar riscos decorrentes do cenário atual, que ainda é de incerteza e insegurança jurídica.
[1] última atualização em 03/04/2020 às 13h06