A má fé e a due diligence 

Por: Antonio Mazzucco e Luiz Gustavo Doles

No momento de qualquer espécie de aquisição, faz-se necessário que o adquirente se resguarde para evitar uma futura discussão acerca da validade do negócio.  

Nesse sentido, é necessário que se realize um procedimento de análise da documentação relativa ao objeto do que está sendo comprado e ao vendedor, com o intuito de mitigar os riscos da operação ao adquirente de boa-fé, razão pela qual qualquer operação de mercado de capitais deve ser precedida de uma due diligence. 

Este levantamento é extremamente importante nas operações denominadas como “porteira fechada”, nas quais a empresa é vendida como se encontra, com todos os seus ativos e suas dívidas. Neste caso, uma DD demonstra detalhadamente todo o risco ao qual o comprador está exposto. 

Trata-se de um processo que visa proteger os interesses de ambas as partes na medida em que as dívidas da empresa a ser adquirida são transferidas para o seu novo dono1 e as dívidas do alienante podem contaminar a operação de M&A (a alienação ou oneração  pode ser considerada fraude à execução na hipótese de tramitar contra o devedor, ao tempo da alienação ou da oneração do bem, ação capaz de reduzi-lo à insolvência2). 

É muito comum que os “problemas” associados a uma due diligence mal feita ou eivada de vícios  somente apareçam muito tempo depois de realizada a venda, fazendo com que a guarda da documentação do processo por prazo de, ao menos, 10 (dez) anos seja recomendável.  

A due diligence é realizada com base nos preceitos da boa-fé e da transparência, ou seja, parte-se do pressuposto que a empresa que está sendo analisada entrega toda a documentação necessária para que se possa verificar o seu estado antes da venda. Além disso, há de se considerar a boa fé objetiva, que nos ensina que a sociedade espera um determinado padrão de comportamento de ambas as partes. 

Trata-se de informação que poderia ser facilmente verificada por qualquer pessoa? Trata-se de informação que dificilmente poderia ser identificada mesmo por profissionais especializados? Tais aspectos podem influenciar na decisão do poder judiciário ou do árbitro na medida em que não se pode culpar o vendedor por não fornecer informações disponíveis ao público em geral que são parte de qualquer operação de M&A, logo, deveriam ser averiguadas pelo vendedor, tais como inscrição da empresa no CNPJ ou a propriedade do domínio da pagina da empresa na internet. 

Contudo, também há de se observar que cada parte é responsável pela sua due diligence, incluindo o tipo de informação que é requisitada e como a mesma é interpretada. Assim, não há como se valer de qualquer medida judicial relacionada à DD por dados que não foram solicitados ou que foram mal interpretados.  

É possível que empresas escondam informações ou disponibilizem dados incorretos com o objetivo de fraudar a due diligence e vender a empresa por preço superior ao seu valor de mercado. 

Devido à natureza sensível das informações discutidas na DD e os impactos que a sua revelação pode causar no mercado, tal discussão muitas vezes é realizada via arbitragem, contudo, este tipo de questão já foi apresentada ao poder judiciário. 

No caso, a fraude na DD pode gerar direito de indenização por danos materiais e morais, contudo, depende de uma série de pressupostos. 

É necessário comprovar a má fé da empresa que ofereceu a informação e analisar o contrato de alienação de participação societária, em especial a cláusula de representations and warranties, e eventual cláusula de multa podendo-se fazer diversos pedidos, entre eles: 

  1. Anulação da operação como um todo 
  1. Abatimento no preço 
  1. Indenização por dano moral 
  1. Indenização por dano material 

Isto ocorreu, por exemplo, da apelação número 1002714-02.2016.8.26.0180 que tramitou perante o TJSP, que discutiu se há ou não vício em operação de venda de participação societária em caso de existência de omissão quanto a dívidas fiscais. 

Os apelantes alegam que a venda da empresa foi realizada sob dolo na medida em que  os vendedores omitiram passivo fiscal de mais de R$ 1.000.000,00 (um milhão de reais) gerado pela adoção de “caixa dois” que somente foi objeto de execução fiscal após a venda da empresa. 

Realizou-se discussão a respeito de boa-fé objetiva, mas o passivo, neste caso, não estava escriturado nos livros contábeis da empresa e a natureza dos débitos tributários impossibilitavam seu levantamento no ato da compra da empresa. Logo, não há o que se discutir com relação à boa fé objetiva pois seria extremamente difícil que a pessoa média fosse capaz de deduzir a existência do débito tributário. 

Além disso, contratos de M&A costumam ter clausula indicando o que está sendo comprado, incluindo eventuais passivos. A inexistência desta cláusula ou a constatação de que a declaração não corresponde à realidade podem gerar discussão judicial ou arbitral. 

Por conta disso, observa-se a extrema importância de se fazer a due diligence, pois é por meio dela que o adquirente de boa-fé poderá levantar todas as informações sobre o objeto da compra e o vendedor, mitigando, dessa forma,  os riscos do negócio jurídico, além da contratação de um advogado habilitado para orientação e levantamento de eventuais riscos envolvidos para que seja possível a tomada de decisão consciente do comprador, ciente da real condição com a qual está lidando, com a  pesquisa e consulta completa e profunda para a verificação e elucidação dos riscos envolvidos. Quanto mais preciso e completo for o exame na due diligence, maior segurança jurídica será atrelada à consecução do negócio. 

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