Por Leticia Cordeiro e Rafael Mello
A reforma trabalhista instituída pela lei 13.467/2017 trouxe a possibilidade de trabalho de lactantes e gestantes em ambiente insalubre (graus mínimo e médio no caso de gestante e quaisquer graus de insalubridade, no caso de lactantes).
Referida possibilidade advém do comando inserido nos incisos II e III do artigo 394- A da CLT, que determina o afastamento da empregada de trabalho em ambientes insalubres quando a empregada “apresentar atestado de saúde, emitido por médico de confiança da mulher”.
Art. 394-A. Sem prejuízo de sua remuneração, nesta incluído o valor do adicional de insalubridade, a empregada deverá ser afastada de:
I – atividades consideradas insalubres em grau máximo, enquanto durar a gestação;
II – atividades consideradas insalubres em grau médio ou mínimo, quando apresentar atestado de saúde, emitido por médico de confiança da mulher, que recomende o afastamento durante a gestação;
III – atividades consideradas insalubres em qualquer grau, quando apresentar atestado de saúde, emitido por médico de confiança da mulher, que recomende o afastamento durante a lactação.
As disposições contidas nos incisos II e III do artigo 394-A da CLT trazia como regra o trabalho de gestantes e lactantes em ambiente insalubre, que seria excepcionada na hipótese de apresentação de atestado médico recomendando o afastamento da referida empregada de exposição a tais condições. Na prática, os dispositivos inauguraram autorização para o trabalho destas empregadas em condições insalubres
Conforme amplamente divulgado na mídia essa inovação legislativa foi objeto muita discussão e debate, haja vista que boa parte dos movimentos sociais ligados à condições de trabalho, integrantes da Magistratura, do Ministério Público do Trabalho e da Ordem dos Advogados do Brasil, bem como parcela relevante do meio acadêmico consideraram tal flexibilização como um retrocesso às proteções mínimas às trabalhadoras gestantes e lactantes.
O tema foi, então, objeto de ajuizamento de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADIN) pela Confederação Nacional dos Trabalhadores Metalúrgicos, tramitando no Supremo Tribunal Federal sob o nº 5938[1].
Em linhas gerais, a ADIN º 5938 trouxe como fundamento ofensa constitucional à proteção da maternidade, à gestação, à saúde, à mulher, ao nascituro, aos recém-nascidos, ao trabalho e ao meio ambiente de trabalho equilibrado previstos nos artigos. 1º, IV, 6º, 7º,XX e XXII, 170, 193, 196, 201, II, 203, I, 225 e 227 da Constituição Federal.
Em 29.05.2019, pelos votos dos ministros Edson Fachin, Luís Barroso, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Dias Toffoli, Marco Aurélio e Celso de Mello, o Supremo Tribunal Federal declarou a inconstitucionalidade da expressão “quando apresentar atestado de saúde, emitido por médico de confiança da mulher” contida nos incisos II e III do artigo 394-A da CLT, de forma que da permissão ao trabalho de lactantes e gestantes em ambiente insalubre.
O único voto contrário, dos 10 votantes, foi o do Ministro Marco Aurélio que considerou a proteção à mulher prejudicial ao gênero, entendo como razoável as considerações e permissões de um profissional médico como possibilidade para o trabalho em ambiente insalubre.
Todavia, todos os demais votos confirmaram o entendimento de ser inconstitucional a permissão do trabalho de gestantes e lactantes em condições insalubres, destacando-se o voto condutor do Ministro Relator Alexandre de Moraes, que trouxe considerações como a possibilidade de realocação ou licença da gestante ou lactante, salientando inclusive, que a proteção feminina em nada implicaria em preconceito ou distinção de tratamento de gênero.
Assim, diante de tais apontamentos, foi proferida decisão mantida a decisão anteriormente realizada em caráter provisório, restando definitivamente afastada a possibilidade de trabalho da gestante ou da lactante em atividades insalubres, independentemente da apresentação de atestado médico.
[1] Processo nº 0069830-37.2018.1.00.0000, Relator: Ministro Relator Alexandre de Moraes, julgamento em 29/05/2019. Documento disponível no endereço eletrônico http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=5447065